No Brasil, criamos muitos negócios todos os dias. Ideias inovadoras que poderiam ser os próximos unicórnios emergem aos arredores da Vila Olímpia, Pinheiros, Paulista… Mas os empreendedores têm o péssimo hábito de gerir negócios da nova economia com os modelos de gestão do século passado. Resultado? As startups quebram!
O cenário é sempre muito parecido. Ideias brilhantes saem do papel depois de:
- muito suor
- alguma incubação em algumas das excelentes incubadoras que temos no mercado (realmente acho que fazemos um bom trabalho de incubação no país).
- um investimento seed.
- e uma série de quebradas de cara, mas que geram aprendizado.
Cria-se um MVP! O empreendedor e seus founders estão oficialmente no mercado. A essa altura a empresa tem uma ideia na praça, uma dezena de colaboradores e um espírito de inovação que as grandes empresas invejam fortemente.
Depois de algum momento levantam a tão sonhada Series A. E o que as startups fazem na largada? Contratam Heads, Managers, dezenas e mais dezenas de pessoas. Pronto! Tá criada a estrutura hierárquica com referência ao modelo de gestão século passado.
Mesmo assim a startup vai que vai. Muitas delas conseguem ainda assim executar bem e às vezes chegam até a levantar a Series B. Mas o fato é que pelo menos 75% delas vão morrer até completarem 5 anos.
Todos os anos, muitas startups e pequenos negócios fecham as portas. E não é por falta de financiamento, discussões entre sócios, regulamentações de mercado, entre outras desculpas. Sim, são várias DESCULPAS.
Afinal, nunca se teve tanto dinheiro disponível na conta dos investidores de risco. Sócios podem discutir, assim como discussões são comuns em qualquer contexto em que exista humanos. Regulações? Aff… se tem uma coisa que inspira startupeiro é revolução.
Na verdade o que temos na maioria dos casos é um desenho organizacional de multinacional em uma empresa de inovação. Os nossos modelos de administração e gestão foram desenhados para atender os interesses da revolução industrial, onde a gemba não tem voz e a estrutura é vertical. Supervisores, coordenadores, gerentes, diretores, superintendente, vice presidente ou qualquer uma das nomenclaturas derivadas disso foram criadas visando um objetivo: comando e controle.
Contratamos pessoas que tem vida adulta fora da empresa. Algumas pagam aluguel, tem filhos e às vezes são fortemente ativas em suas comunidades pessoais ou técnicas. A partir do primeiro dia de trabalho as empresas, nesse modelo clássico, passam a tratá-las como crianças. Dizendo exatamente o que tem que fazer e como. PMO, gerente de projetos, auditorias ou governança de qualquer tipo supervisionam para saber se os adultos crianças estão fazendo “certinho”. Se você entregar seus projetos no prazo em 97% das vezes DONE! Você está promovido. Mas alguém realmente se pergunta se esse projeto mudou a vida do cliente? Ou se trouxe X% a mais de revenge? Geralmente não.
Sabe por que se fala tanto sobre modelos ágeis hoje? Porque o modelo de gestão do século passado não cabe mais no mundo VUCA que temos hoje. Volatilidade, incertezas e a necessidade se reinventar nunca foi tão demandado. Nossos clientes tem hoje uma oferta de produtos e serviços nunca antes vista. A comunicação nunca foi tão rápida. E nunca se criaram tantas empresas como hoje.
Agora pensa no cenário da startup. Uma empresa jovem, cheia de jovens, que tem recursos limitados e que o pior inimigo é o tempo. Qual é a chance de fracassar nesse contexto tão intenso por ter um modelo que não privilegia a auto-organização dos times? Que não horizontal de verdade? Que não permite que a inovação seja uma emergência de dentro do time? É de 75%!
Estou falando de agilidade de verdade. Scrumban não existe! Tá errado! E muitas startups estão errando em não estudar e usar os conceitos corretamente. Sabe por quê? Primeiro porque possivelmente o seu time, quem faz de verdade, não tem voz nas decisões estratégicas. No máximo no tático. Porque a startup está tão dedicada a entregar o roadmap que mal discute sobre as lições aprendidas. Porque, assim como nas empresas tradicionais, não existem profissionais especializados em Agile. Porque o mindset dos modelos de gestão tradicionais estão enraizados.
Eu já escutei muitas frases do tipo:
- “Somos uma empresa pequena. Pega o PO e faz ele ser scrum master também”.
- “Ainda não começamos uma Sprint, mas deixamos o time no Kanban por enquanto” (O gestor nesse caso não sabia nem a definição de lead time).
- “A empresa é minha”.
- “Temos que mostrar o que o board quer ver”.
- “Estamos muito ocupados agora. Já fechamos o roadmap do trimestre e temos que entregar”.
- “Eu sei que deveríamos fazer isso, mas não é bem assim”.
Alguma semelhança com empresas grandes e tradicionais? Se bobear, as tradicionais dão mais importância ao papel do scrum master do que as startups, mas não sabem como usá-la.
O PMBOK não funcionou e o scrum não vai funcionar também. É necessário que o novo modelo de gestão e o ágil sejam incorporados na fundação das startups. Caso contrário, elas não conseguirão passar pelo o que o autor Eric Ries define como “segunda fundação”. Esse momento em que as startups começam a crescer. Que não é mais factível fazer do mesmo modo, sem organização. Quando se pensa em implementar processos. Só que a maioria delas perde o poder na inovação. Mas aí eu te pergunto: quais processos podem permitir que a segunda fundação ocorra sem que a startup perca a inovação? Os ágeis! E implementados por pessoas que são capacitadas para isso. Também e preciso haver uma transformação de mindset. Os CEOs e fundadores precisam parar de adorar a Insper, FGV, Dom Cabral e por aí além. Por que essas instituições não sabem ensinar a nova filosofia de gestão. Precisamos fazer Management 3.0, implantar scrum ou Kanban do jeito certo. Precisamos criar mecanismos que façam os Heads trabalharem e empoderem a Gemba. Dando ferramentas e escalando agile do jeito certo. Sem SAFe ou “modelo Spotify”, por favor. E por isso que eu defino como nova filosofia de gestão, não modelo.
Precisamos ensinar as pessoas a fazer OKR do jeito certo. E criar ambientes para que elas mesmas possam dizer seus objetivos e como alcançá-los. Precisamos de RH Ágil dentro da empresa.
Nas instituições também tradicionais, estamos educando as pessoas para que elas se tornem obsoletas ao tempo em que elas concentram todo o seu esforço para ver algum ROI do investimento que elas fizeram num MBA. Enquanto a nova geração se prepara feito um rolo compressor para ocupar cadeiras em nossas empresas. Sem tolerar feedbacks vazios e planos de carreira se propósito. Precisamos acabar com a cultura de que certificações não tem valor. As pessoas acham que sabem fazer scrum, por exemplo, mas quem do seu time tem um CSM ou PSM? Ou um CSPO? CSD então?
Você sabe qual é o índice de Turnover em startups no Brasil? 1 a cada 2 colaboradores saem da empresa em até 6 meses. Pois bem, você já ouviu falar na Curva de Tuckman?
De que forma você esperar performar naquele cenário VUCA da startup se sua empresa está sempre em Forming e Storming?
O mundo está mudando mais rápido do que nunca. Precisamos de Transformação Organizacional que tenha os fundamentos do Manifesto Ágil presentes no dia a dia.
Veja alguns depoimentos do time de atendimento (tem alguém que representa melhor a gemba?) Lovemondays sobre o Nubank:
Olha aí em cima a Gemba com voz ativa junto ao time de engenharia.
Não parece que valorizamos mais indivíduos e interações mais do que processos e ferramentas?
Precisamos valorizar muito os soft skills na hora de contratar, mas eu não acho que só isso seja o suficiente. Sem os hard skills que a nova administração exigirá nivelamos por baixo. Porque infelizmente as instituições de ensino tradicionais estão atrasadas no seu tempo. Conhecimentos sobre Agile, Management 3.0 e Lean precisam estar na base de qualquer profissional. Do CEO ao analista na Gemba.
Com isso, as startups terão muito mais chance de sucesso contra a dura estatística.
Sobre o autor:
Alex Ivonika
Alex Ivonika tem 9 anos de experiência com tecnologia. Já foi premiado com melhor case mobile da América Latina pela MMA, melhor aplicativo para tablets pelo Tela Viva Móvel, já trabalhou na Startup do ano aleita pela LIDE e já teve 5 aplicativos em destaque na App Store. É palestrante e já participou de eventos importantes, como, Campus Party e TDC. Já deu aulas e palestras em instituições como, USP, ESPM e Instituo Mauá de Tecnologia. E ainda é mentor voluntário na aceleradora de startups LIGA Ventures. Hoje é Agile Coach na Xerpa, uma startup que está mudando o RH no Brasil.
Leader Coach®
Certified Agile Coach (CAC®)
Certified Scrum Master (CSM®)
Certified Scrum Product Owner (CSPO®)
Design Thinker
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